9.5.08

A Rosa


Por uns tempos morei numa aldeia dos arredores de Coimbra, não aquilo não era subúrbio, era aldeia mesmo, com a mercearia suja e atascada de produtos fora do prazo de validade misturados com as rações para o gado e os adubos para a agricultura, o adro da igreja e a missa cheia de velhos e de velhas e a taberna. A taberna, que se dava pelo nome de café qualquer coisa, escura e mal engendrada, a qualquer hora do dia ou da noite cheia de homens mais ou menos ordinários a beberem “finos” com martini, "finos" com vinho branco, "finos" com vinho do porto. E a dona do café, a taberneira, a Rosa, uma Rosa espantosa. A Rosa era muito nova e gira e metia o marido na ordem, embora este dormisse até ao meio-dia enquanto ela se esfalfava desde a madrugada. A Rosa usava calças justíssimas, t-shirts mínimas, o cabelo muito bem tratado com uma franja moderna, e os homens tinham-lhe cá um respeito... eu perdia-me a vê-la actuar, grande mulher.
Um dia, pelo mês de Maio, saí para ir à farmácia, a farmácia era, para além da Rosa, a modernidade daqueles arrabaldes. Gosto muito de farmácias, não pelos medicamentos, que os não tomo, mas por todas as promessas encerradas nos boiões de cremes e frascos de vitaminas. Naquele dia fraquejei por um dispendioso milagre-anti-celulite. De seguida entrei no café-taberna, pedi o que queria e pus-me, muito discretamente, a ler o panfleto, a inteirar-me das vezes que teria que esfregar o unguento e a imaginar umas pernas lisas e maravilhosas. Perdida naqueles devaneios ouvi por trás de mim a voz da Rosa, com quem eu nunca tinha trocado mais do que bom dia, boa tarde, um café, muito obrigada, a voz sábia da Rosa – isso não presta, é dinheiro deitado fora. É mesmo.

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