11.4.08

No dia em que fui à consulta de esterilidade


Um dia recebi em casa um postal do Hospital a avisar-me que no dia tantos tinha uma consulta de ginecologia, motivo, esterilidade. No mínimo insólito, para quem tinha tido dois filhos, seguidinhos nos dois anos anteriores, sem outra intervenção que não fosse a do pai dos ditos. Ainda telefonei para o hospital, mas disseram-me que era assim mesmo, que no dia tantos devia estar lá às 9 horas com o cartãozinho verde. Bem mandada fui, entre nesse vestiário, dispa-se vista a bata e espere que a chamem. O que a chamem tardou, de dentro do gabinete ouvia-se a voz grossa do médico, há quanto tempo não tem relações sexuais com o seu marido? e de dentro do gabinete ouvia-se a voz sumida da mulher, há mais de quinze dias senhor doutor. Há mais de quinze dias? – a voz grossa e indignada do médico – a senhora quer fazer omoletas sem ovos? Oh senhor doutor ele chega sempre a casa bêbado e adormece logo - a voz sumida da mulher - e não ouvi mais. A senhora do vestiário pode entrar. Era eu, entrei, aquilo não era uma consulta, era uma conferência, duas tias médicas pintadas e sarapintadas, colares, pulseiras e anéis, o médico da voz grossa e mais dois imberbes, eu na frente, pés descalços, enfiada na bata desbotada onde cabiam mais três. Oh minha senhora estas hormonas estão muito baixinhas, muito baixinhas, isto é que foi um fim de semana de caça ao javali, vá deite-se ali, deite-se ali para a observarmos.
A cena: duas tias e dois imberbes por detrás de uma secretária, eu de bata azul desbotada deitada na marquesa, um senhor doutor voz grossa e enfatuada na exaltação da caçada ao javali. No final Deus ouviu as minhas preces – e não é que o raio do javali nos escapou. E foi desde esse dia que continuei a não gostar de caçadores.

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