Contas de Mercearia
Este post, e os comentários, ilustram muito bem um pecado em que todos caímos: o de analisarmos e criticarmos o que não conhecemos, tomando-nos como medida de todas as coisas, e fazendo contas de mercearia. Devo dizer que conheço e tenho a maior consideração pela autora do post, mas não posso deixar de discordar da análise precipitada que faz.
Começo por discordar do termo caridade neste contexto, a emergência infantil e o acautelar dos interesses das crianças abandonadas, maltratadas ou cujas famílias não têm capacidade para acautelar, não é caridade, é um dever da sociedade e do estado. Plasmado por Declaração Universal.
De seguida, é um erro crasso transpor a nossa realidade e orçamento familiar para uma instituição que acolhe 40 crianças, de recém-nascidos até aos três anos, em que todo o serviço é garantido por profissionais pagos. Tem que ter funcionários permanentes assegurados por turnos 24 sobre 24 h (de onde que alguns pagos em regime nocturno), fins-de-semana, férias. Como IPSS tem que ter, por exigência da Segurança Social, educadores de infância, psicólogos e assistentes sociais. Que têm muito que fazer, sejam eles ou elas bons profissionais. É normal que a direcção da instituição, ou parte dela, seja também assegurada profissionalmente. No caso da instituição referida, que só conheço da comunicação social, as despesas são acrescidas por acolherem apenas bebés: mais exigências de pessoal, fraldas etc. Infelizmente os meninos acolhidos nestas instituições inspiram muito mais cuidados médicos que os nossos filhos e, mesmo considerando que não pagam consultas, as despesas com medicamentos são, em geral, muito maiores. Isto são apenas alguns exemplos que me ocorrem e que justificam as quantias exorbitantes em que ficam as crianças institucionalizadas, venham as verbas de doações ou dos nossos impostos. Mais uma razão, embora não a mais importante, para que o estado, os tribunais, e a segurança social (e já agora nós, sociedade) fossem mais céleres no encontrar de um futuro para esses meninos.
Dizem que é um defeito nosso, como portugueses, a falta de confiança que depositamos nos outros, que nos leva a esquecer que há muito mais coisas entre os céus e a terra e que, por incrível que pareça, que não somos uma súcia de incompetentes ou pior, de mal feitores prontos a abotoarmo-nos com o que não é nosso.
3 comments:
Isabel,
não escrevi o post de ânimo leve, até esperei vários dias desde a reportagem.
Conheço duas instituições, em Viseu, que fazem o mesmo que a Ajuda de Berço, uma recolhe bebés e outra meninas, todos retirados às suas famílias. Garanto-te que não gastam um quinto do valor despendido pela Ajuda de Berço por criança.
Quanto ao termo caridade foi intencional, já por várias vezes me pareceu que quem dirige a instituição o faz com muita boa vontade e com mais vontade ainda de ficar na foto.
Admito poder estar errada mas, mesmo assim, continua a ser a minha opinião: não basta querer ajudar é preciso fazê-lo de maneira economicamente sustentável.
Num ponto estamos absolutamente de acordo:temos todos que exigir que o estado, os tribunais e a segurança social sejam céleres e competentes a analisar e resolver todos os casos relativos a crianças.
Eva
Diz-me quem trabalha nessas coisas que instituições que gastam 1/5 do que gasta a "ajuda de berço" não podem estar a fazer um bom trabalho.
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