26.10.09

Outubro

Li o Outubro do Rui Bebiano. Não entendo como se pode considerar o livro do desencanto. Eu, talvez por mais nova (e não sou assim tanto), quase poderia dizer que nasci desencantada. Apesar disso sempre me comoveu a “fé” dos camaradas na festa do Avante, a “fé” dos camaradas, não dos dirigentes. Sempre me comoveu e tenho uma imensa admiração pelas centenas de militantes, de clandestinos, que em Portugal lutaram contra a ditadura. Não me impressionei quando vi os primeiros dos grandes a serem julgados e postos na rua, nunca me pareceu que aquilo tivesse algum laivo de democracia, muito menos paredes de vidro. E apesar disso votei muitas vezes no partido comunista, ou nas suas alianças, por achar que eram uma força importante – como oposição - no parlamento, ou em qualquer dos lados nas autarquias (nestas sobretudo). Hoje, já não estou tão convencida, até por farta, farta até à medula, da cassete e dos métodos.
E sobretudo, não entendo, o que é que ser de esquerda tem a ver com aquilo tudo. O dizer, ou pensar, "pode-se ser de esquerda apesar de Outubro" já me parece um grande abuso

Ao ler o livro do Rui, lembrei-me de uma história engraçada, e reveladora, contada por uma amiga francesa. Não recordo todos os pormenores, mas no essencial a minha amiga, no início dos anos setenta, cheia de fervor viajava pela Rússia. Fez uma viagem nocturna de comboio, talvez Leninegrado-Moscovo. De manha, no wagon-lit, reparou que lhe faltava uma jóia, talvez um colar. E deu conta da ocorrência a quem de direito. À noite, alojada num hotel em Moscovo, bateram-lhe à porta do quarto, o director do hotel, um polícia e um director dos caminhos-de-ferro. Este último entregou-lhe a jóia “perdida”, declarando “Minha Senhora, nos comboios soviéticos nada desaparece”.

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