17.7.09

Férias Grandes


Só aos nove, dez, anos conheci o novo-riquismo do Algarve. Até lá o Algarve era algo muito, muito, longe, nem seria bem Portugal, muito mais longe e estrangeiro que Espanha, que era logo ali ao lado. Até lá praia era no norte, ali onde ainda hoje os pescadores morrem no mar, o mar gelado, e não me lembro de algum dia ter deixado de tomar banho, a infância que nos protege. A praia eram os meus avós que alugavam uma casa que os pescadores vagavam no Verão, para onde iriam morar os pescadores no Verão? e a família que se mudava toda para lá, o meu avô passava o dia no café sobre a praia, a ler e a escrever, olha lá está o avô com os seus livros no café a ler e a escrever, e a avó e as tias solteiras a tomarem conta da criançada na barraca, na praia. A tia que era um ás do jogo do prego, o creme nívea da lata azul que só por convicção protegia dos raios solares. Havia sempre dias de chuva nos meses de Agosto que lá passávamos, a praia cheia de pulgas da areia e as barracas, unidas pelo panos, nessa altura já tínhamos amigos em toda a vizinhança, transformavam-se em castelos vagamente persas, as toalhas de praia quais tapetes de odaliscas. No resto dos dias era praia de manha à noite, à noite íamos com as tias solteiras ao café. Pelas cinco da tarde chegava a empregada com o açafate do lanche, café com leite em garrafas e muitos pães com queijo ou manteiga ou, delícia das delícias, com pasta, que ainda não era patê, de sardinha de lata.
Apenas uma vez o verão foi diferente, quis o acaso que a minha mãe me mandasse fazer praia com a minha madrinha e as suas irmãs, todas mulheres solteiras e sem filhos e que da infância sabiam pouco. Era uma casa imponente numa das ruas antigas da Póvoa, uma empregada de crista na cabeça que nos servia sopa, prato de peixe, prato de carne fruta e doce numa mesa muito comprida e austera, a criança que era eu em silêncio. O quarto imenso aterrorizava-me as noites, de dia era uma princesa, tive todos os brinquedos de praia, até o moinho de areia, vi todos os filmes da Disney no Cine-Teatro, mas que saudades da liberdade dos meus irmãos.
Este ano volto às praias do norte, ao vento e às manhãs de nevoeiro, ao cheiro a sargaço, as mulheres, de saias arregaçadas a apertarem-lhes as coxas, na apanha do sargaço para adubarem as terras, a tronchuda da Póvoa é do melhor que há. Vou ainda mais para norte, lá onde vive o velho reaccionário. Mas já não é a mesma coisa.

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