3.7.08

Syntagma




A história vem contada e ilustrada em dois diários portugueses, eu ouvi-a recontada na Antena 2 pelo Pedro Malaquias. Parece que uma mulher morreu numa sala de espera de um hospital de Nova Iorque e para ali ficou por mais de uma hora, caída de bruços, sem que os outros esperantes, seguranças e até um polícia movessem um dedo para averiguarem o que se passava ou prestarem auxílio (que as câmaras de vigilância registaram sinais de vida na mulher durante uma boa meia hora).
As histórias são como as cerejas e atrás de umas vêm outras:
Numa noite de Atenas estava eu a assistir a um filme mudo num écran gigante da Praça Syntagma (o que eu gosto do som da língua grega, quando a menina do metro dizia Syntagma, acentuando o á final, aquilo soava-me a uma cantata de Bach). Estava sozinha e mais do que assistir ao filme não me apetecia regressar ao hotel e por isso atendia mais a quem se sentava à minha volta, e não era muita gente. Duas cadeiras ao lado senta-se a mulher mais suja e mal-cheirosa que imaginar se possa, uma obesidade pornográfica coberta de andrajos. Por pouco tempo ficou a mulher sentada, porque o álcool era tanto que não se segurava e começou a resvalar perigosamente. Uma rapariga da assistência tenta ajudá-la, um polícia aproxima-se, a mulher nem os ouve. Percebo que os dois, de forma bem delicada, tentam convencer a andrajosa a sair dali, a ir dormir para banco mais confortável, em vão. O polícia afasta-se e regressa com dois pares de luvas, das que usam os médicos ou os enfermeiros, calça um dos pares e estende o outro à rapariga, juntam três ou quatro cadeiras, pegam na mulher e deitam-na na cama improvisada, como quem pega num filho adormecido. Toda esta humanidade se passou numa noite quente de um verão tardio, em Atenas, na Praça Syntagma.

No comments: